Maria Navalha é uma pombagira que atua na linha da Malandragem, também conhecida como a mulher de Zé Pilintra. O nome se deve ao instrumento que foi muito utilizado por criminosos, pois é uma arma perigosa que acaba se passando despercebida. Tornou-se popular pela discrição, leveza e facilidade de ataque, portanto, muitos marginalizados andavam com essa arma no bolso, tanto para a defesa quanto para o ataque.
Segundo o autor Danilo Coppini:
“A navalha simboliza o código do silêncio, a Lei do ‘não sei e não vi’, pois, a malandragem é exatamente isso, saber andar em todos os territórios, sem se comprometer ou ‘amarrar’ palavra. É saber se comunicar com todo tipo de pessoa, mantendo a postura e evitando determinados tipos de contágio.” (COPPINI, 2018, p. 470)
Assim como ocorre com outras entidades, muitas histórias diferentes são atribuídas à Navalha, pois o termo “Maria Navalha” não se refere apenas a uma única pessoa, mas sim a um grupo de mulheres cujas energias se assemelham ao arquétipo de uma vida boêmia, porém difícil, na Lapa e arredores. Ou seja, são diversas as lendas de Maria Navalha, assim como diversas as ‘almas’ que assumem essa identidade nos terreiros e incorporam em médiuns.
Sendo assim, esse arquétipo compreende a malandra, mulher da vida, dona de cabaré e assassina. Ela seduzia as vítimas com toda a sua beleza e lábia, utilizando como arma a navalha – que mantinha escondida debaixo da saia. Assim como a maioria das pombagiras, sabe-se que sua história foi repleta de dor, agonia e atitudes motivadas pelo contexto.
Como boa malandra, ela sabe ser maleável em uns sentidos e dura em outros. Dizem que o malandro é aquele que cai bonito, porque sabe que vai cair. A malandragem pede jogo de cintura e saber falar a coisa certa na hora certa. Por esse motivo, é conhecedora dos labirintos psíquicos e da fraqueza dos homens, sabendo se aproveitar desses aspectos. Assim, muitos médiuns e consulentes “invocam seus poderes em busca de discernimento acerca das pessoas ou situações. Pedem sua proteção em todos os aspectos e sua experiência adquirida nas ruas para conduzir seus atos. […] As mulheres costumam pedir sua intervenção nos casos em que os homens são infiéis, pois, a navalha também pode cortar a libido. Outro aspecto interessante é que a Maria Navalha tem forte associação com espíritos conectados ao dinheiro, portanto, pode corroborar muito nesse aspecto.” (COPPINI, 2018, p. 470)
Uma das lendas é de uma mulher que foi abandonada pelos pais ainda criança e foi levada ao caminho da prostituição para se sustentar. Um dia, já adulta, foi atacada por um grupo de homens que a jogou no chão e estavam prestes a molestá-la, quando foram impedidos por um homem. Vestido de terno branco e chapéu, Zé Pilintra protegeu a mulher e ofereceu uma navalha para ela se defender. Daí que vem a ideia de que Maria Navalha é mulher de Zé.
Outra lenda narra que ela nasceu em um morro carioca e foi criada por um padrasto abusivo. Devido a vida difícil, fugiu com sua irmã mais nova e acabou nas ruas da Lapa. Em uma terceira história, Maria teria fugido de uma família abusiva, mas era de origem baiana. Tanto a origem em vida se difere, quanto seu renascimento como entidade. Alguns contos narram que ela já estava morta quando encontrou Zé Pilintra. Também é notável a diversidade dos tipos de morte: vítima de algum ataque cruel, esfaqueada no meio de uma briga ou degolada por um inimigo. Na maioria dos contos, a mulher que se tornaria Maria Navalha é descrita com um temperamento explosivo e que não media esforços para arrumar confusão ou gerar uma briga. Há um famoso trecho que diz que ela “bebia como um marinheiro, fumava como um estivador e brigava como um leão de chácara, mas sem perder a feminilidade”.
O doutor em filosofia Rafael Haddock-Lobo escreve em um artigo: “A mulher navalhadora é, também, é certo, a que carrega a arma por debaixo de suas vestimentas – é bom lembrar que Maria Navalha pode usar tanto saia quanto calça. Em suas mãos, a navalha é tanto a arma da luta que só é acionada em última instância (pois a malandragem ensina a recuar o máximo que puder, deixar que o inimigo venha pra cima de você, e nunca partir direto ao ataque), mas também é a operadora do renascimento e feitora das curas que se escondem por detrás do efun, do waji e do ossun.” (HADDOCK-LOBO, 2020, p. 18)
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Fontes
HADDOCK-LOBO, Rafael. MARIA NAVALHA E A FILOSOFIA POPULAR BRASILEIRA – UM “TRABALHO” DE CAMPO. Revista Calundu, –Vol.4, N.2, Jul-Dez 2020.
COPPINI, Danilo. QUIMBANDA: O culto da Chama Vermelha e Preta. Via Sestra, 2018.